O espelho que engana, Theodoor Galle

“Specvlvm fallax” (O espelho que engana)

“Specvlvm fallax” (O espelho que engana) 850 480 V.M. Kwen Khan Khu

Muito prezados/as leitores/as:

Tomo a esferográfica para fazer-lhes chegar alguns comentários relacionados com a importância profunda de aproximar-nos à TÉCNICA DA VERDADEIRA auto-observação e nossos anseios por viver dentro da realidade e não dentro das fantasias.

Antes de entrar em matéria, quero dizer-lhes que a presente gravura tem por título…

…SPECVLVM FALLAX
─‘O espelho que engana’─

O espelho que engana, Theodoor Galle

A gravura é a segunda de uma série de doze gravuras que aparecem no livro Duodecim specula Deum aliquando videre desideranti concinnata, ‘Doze espelhos devidamente dispostos para a pessoa que deseja algum dia ver Deus’, editado pela primeira vez em 1601 em Amberes. O gravador e editor flamengo Theodoor Galle ─1571-1633─ é o autor dos desenhos.

Aproximando-nos das figuras dessa ilustração, vemos, ante tudo, uma raposa soprando uma bolha de sabão que assume a forma do mundo. O fundo está repleto de símbolos de engano terrenal: uma mulher olhando-se num espelho, um bobo da corte contemplando a lua através de um espelho, um pintor representando a um anjo como um demônio, um camaleão que se pode disfarçar de lebre, bode ou raposa, um tigre que não se reconhece no espelho e um cavaleiro que rouba o filhote de tigre. A gravura tem uma inscrição em latim:

«Fallacis SPECVLI caueris te ludat imago: Non aurum est, quidquid bractea fulua tegit».

‘Evita que a imagem do ESPELHO ENGANOSO zombe de você: nem tudo o que uma lâmina esconde é ouro’.

Na parte inferior encontra-se uma inscrição das cenas representadas na imagem, cada uma marcada com uma letra do alfabeto.

Letras e significados:

A. Fallax et mendax speculum: ‘Um espelho enganoso e mentiroso’.

B. Stultus se in luna contemplans: ‘Um bobo contemplando-se na Lua’.

C. Fallitur, pro angelo daemonem pingens: ‘Engana-se quem pinta um demônio em lugar de um anjo’.

D. Mundus, speculorum fallacium fallacissimum: ‘O mundo, um espelho enganoso, o mais enganoso’.

E. Mundus luna inconstantior: ‘O mundo é mais instável do que a Lua’.

F. Vulpecula, mundi fallacis typus: ‘A pequena raposa, símbolo do mundo enganoso’.

G. Vulpecvla, in concha e sapone bullosum mundum festuca excitat: ‘Pequena raposa, em uma concha, uma pitada de sabão desperta a bolha do mundo’.

H. Tigris viua adhuc capi nequiuit: ‘O tigre ainda não foi capturado vivo’.

I. Catulus aliquando ab equite surripitur: Às vezes, um cavaleiro rouba o filhote de tigre’.

K. Mater obiecto speculo fallitur: ‘A mãe ─a mãe tigre─ deixa-se enganar pelo espelho’.

L. Chamaeleontis vafricies: ‘ A forma e os meios de enganar do camaleão’.

Tratando de afundar no que sugerem esses textos, diremos:

Certamente, amigos e amigas, enquanto tivermos a Consciência adormecida, viveremos sempre enganados por essa existência mayávica, e esse hipnotismo nos mantêm atados à famosa Roda do Samsara. Toda pessoa adormecida psiquicamente sempre será escrava da roda de nascimentos e mortes ou Roda do Samsara.

Por isso, a menção do espelho, nessa gravura, é para atrair nossa atenção acerca do ilusionismo que fabrica nossa psique quando nossos sentidos são fascinados e nunca vemos as realidades que, na verdade, estão presentes na natureza. Daí o que nos diz nosso Avatara, Samael Aun Weor, acerca de aprender a transformar as impressões que recebemos ao longo da nossa vida, para não andarmos vivendo de imagens deformadas por nossos agregados psicológicos. Dessa forma, nosso psiquismo sempre estará engarrafado e nunca seremos livres.

Certamente, parece incrível que, naqueles séculos XV e XVI, muitos ocultistas dedicaram-se a mostrar às multitudes a miragem que constantemente o EU está fabricando de falsas concepções, deformando as impressões que recebemos através dos cinco sentidos.

Desse modo, quando nos diz que um bobo se está contemplando na Lua, está-nos advertindo de que justamente nossa psicologia é lunar e, nessa falsa psicologia, pretendemos observar-nos.

Ou talvez, quando chegamos à falsa concepção de que alguém é um demônio, mesmo que realmente seja um anjo.

Também nós que cremos que nosso mundo é maravilhoso, quando, na verdade, está respingado de incongruências em todos os seus âmbitos.

E o que dizer da raposa que, de uma bolha de sabão, é capaz de criar um mundo? Com muitíssima razão, o V.M. Samael diz-nos em seu tratado intitulado ROSA ÍGNEA, que o corpo mental das pessoas comuns e correntes tem uma forma que se aproxima da duma raposa. A mente é uma raposa maligna que sempre anda criando problemas em todas as partes.

O tigre, animal considerado por muitas culturas desde antigamente como muito astuto, está dentro de nós, simbolicamente falando, em estado de catalepsia; está como morto. Por isso diz: «O tigre ainda não foi capturado vivo».

E quando pretendemos despertar esse tigre da auto-observação, então passa de repente um cavaleiro ─um agregado psicológico─ que nos rouba o filhote que nos poderia outorgar a faculdade do DESPERTAR que tanto ansiamos.

Igualmente, quando nos descreve à mãe-tigre como se deixando enganar ante o espelho, é porque nossa psicologia está em estado de coma e não percebe a realidade.

Finalmente, cada vez que se tratou de definir os truques do camaleão para evitar ser pego em suas travessias, tudo isso associou-se igualmente com as mudanças que podemos perceber na pluralidade psicológica dos humanoides racionais que povoam nosso mundo.

Acrescento agora algumas frases oportunas para serem refletidas:

«Qualquer preponderância da fantasia sobre a razão é um grau de loucura».
Samuel Johnson

«Para tudo existe um momento marcado, e cada fato tem seu tempo marcado no céu».
Eclesiastes

«O nascido na terra, na terra cai, e volta ao céu o que proveio do céu».
Eurípides

«Lutar contra nosso destino seria um combate como o do molho de espigas que se quiser resistir à foz».
Lord Byron

«O fanatismo é para a religião o que a hipocrisia para a virtude».
Charles Palissot

UT SEMENTEM FECERIS, ITA METES.
─‘Como preparares a semente, assim recolherás’─.

KWEN KHAN KHU